segunda-feira, 20 de junho de 2011

Fato Social

O QUE É FATO SOCIAL?
Antes de indagar qual o método que convém ao estudo dos fatos sociais, é necessário saber que fatos podem ser assim chamados. A questão é tanto mais necessária quanto esta qualificação é utilizada sem muita precisão. Empregam-na correntemente para designar quase todos os fenômenos que se passam no interior da sociedade, por pouco que apresentem, além de certa generalidade, algum interesse social. Todavia, desse ponto de vista, não haveria por assim dizer nenhum acontecimento humano que não pudesse ser chamado de social. Cada indivíduo bebe, dorme; come, raciocina e a sociedade tem todo o interesse em que estás funções se exerçam de modo regular. Porém, se todos esses fatos fossem sociais, a Sociologia não teria objeto próprio e seu domínio se confundiria com o da Biologia e da Psicologia.
Na verdade, porém, há em toda sociedade um grupo determinado de fenômenos com caracteres
nítidos, que se distingue daqueles estudados pelas outras ciências da natureza.
Quando desempenho meus deveres de irmão, de esposo ou de cidadão, quando me desincumbo de encargos que contraí, pratico deveres que estão definidos fora de mim e de meus atos, no direito e nos costumes. Mesmo estando de acordo com sentimentos que me são próprios, sentindo-lhes interiormente a realidade, esta não deixa de ser objetiva; pois não fui eu quem os criou, mas recebi-os através da educação. Contudo, quantas vezes não ignoramos o detalhe das obrigações que nos incumbe desempenhar, e precisamos, para sabê-lo, consultar o Código e seus intérpretes autorizados! Assim também o devoto, ao nascer, encontra prontas as crenças e as práticas da vida religiosa; existindo antes dele, é porque existem fora dele. O sistema de sinais de que me sirvo para exprimir pensamentos, o sistema de moedas que emprego parapagar as dívidas, os instrumentos de crédito que utilizo nas relações comerciais, as práticas seguidas na profissão, etc., etc., funcionam independentemente do uso que delas faço. Tais afirmações podem ser estendidas a cada um dos membros de que é composta uma sociedade, tomados uns após outros. Estamos,pois, diante de maneiras de agir, de pensar e de sentir que apresentam a propriedade marcante de existir fora das consciências individuais.
Esses tipos de conduta ou de pensamento não são apenas exteriores ao indivíduo, são também dotados de um poder imperativo e coercitivo, em virtude do qual se lhe impõem, quer queira, quer não. Não há dúvida de que esta coerção não se faz sentir, ou. é muito pouco sentida quando com ela me conformo de bom grado, pois então torna-se inútil. Mas não deixa de constituir caráter intrínseco de tais fatos, e a prova é que se afirma desde que tento resistir. Se experimento violar as leis do direito, estas reagem contra mim de maneira a impedir meu ato se ainda é tempo; com o fim de anulá-lo e restabelecê-lo em sua forma normal sejá se realizou e é reparável; ou então para que eu o expie se não há outra possibilidade de reparação. Mas, e em se tratando de máximas puramente morais? Nesse caso, a consciência pública, pela vigilância que exerce sobre a conduta dos cidadãos e pelas penas especiais que têm a seu dispor, reprime todo ato que a ofende:Noutros casos, a coerção é menos violenta; mas não deixa de existir. Se não me submeto às convenções mundanas; se, ao me vestir, não levo em consideração os usos seguidos em meu país e na minha classe, o riso que provoco, o afastamento em que os outros me conservam, produzem, embora de maneira mais atenuada, os mesmos efeitos que uma pena propriamente dita. Noutros setores, embora a coerção seja apenas indireta, não é menos eficaz. Não estou obrigado a falar o mesmo idioma que meus compatriotas, nem a empregaras moedas legais; mas é impossível agir de outra maneira. Minha tentativa fracassaria,lamentavelmente, se procurasse escapar desta necessidade. Se sou industrial, nada me proíbe de trabalhar utilizando processos e técnicas do século passado; mas, se o fizer, terei a ruína como resultado inevitável. Mesmo quando posso realmente me libertar destas regras e violá-las com sucesso, vejo-me sempre obrigado a lutar contra elas. E quando são finalmente vencidas, fazem sentir seu poderio de maneira suficientemente coercitiva pela resistência que me opuseram. Nenhum inovador, por mais feliz, deixou de ver seus empreendimentos se chocarem contra oposições deste gênero.

Emile DURKHEIM "O que é fato social?" In: As Regras do Método Sociológico.Trad. por Maria Isaura Pereira de Queiroz. 6.a ed. São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1972. p. 1-4, 5, 8-11
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quarta-feira, 15 de junho de 2011

Crônica Armando Nogueira

Peladas
Armando Nogueira

Esta pracinha sem aquela pelada virou uma chatice completa: agora, é uma babá que passa, empurrando, sem afeto, um bebê de carrinho, é um par de velhos que troca silêncios num banco sem encosto.

E, no entanto, ainda ontem, isso aqui fervia de menino, de sol, de bola, de sonho: "eu jogo na linha! eu sou o Lula!; no gol, eu não jogo, tô com o joelho ralado de ontem; vou ficar aqui atrás: entrou aqui, já sabe." Uma gritaria, todo mundo se escalando, todo mundo querendo tirar o selo da bola, bendito fruto de uma suada vaquinha.

Oito de cada lado e, para não confundir, um time fica como está; o outro jogo sem camisa.

Já reparei uma coisa: bola de futebol, seja nova, seja velha, é um ser muito compreensivo que dança conforme a música: se está no Maracanã, numa decisão de título, ela rola e quiçá com um ar dramático, mantendo sempre a mesma pose adulta, esteja nos pés de Gérson ou nas mãos de um gandula.

Em compensação, num racha de menino ninguém é mais sapeca: ela corre para cá, corre para lá, quiçá no meio-fio, pára de estalo no canteiro, lambe a canela de um, deixa-se espremer entre mil canelas, depois escapa, rolando, doida, pela calçada. Parece um bichinho.

Aqui, nessa pelada inocente é que se pode sentir a pureza de uma bola. Afinal, trata-se de uma bola profissional, uma número cinco, cheia de carimbos ilustres: "Copa Rio-Oficial", "FIFA - Especial." Uma bola assim, toda de branco, coberta de condecorações por todos os gomos (gomos hexagonais!) jamais seria barrada em recepção do Itamarati.

No entanto, aí está ela, correndo para cima e para baixo, na maior farra do mundo, disputada, maltratada até, pois, de quando em quando, acertam-lhe um bico, ela sai zarolha, vendo estrelas, coitadinha.

Racha é assim mesmo: tem bico, mas tem também sem-pulo de craque como aquele do Tona, que empatou a pelada e que lava a alma de qualquer bola. Uma pintura.

Nova saída.

Entra na praça batendo palmas como quem enxota galinha no quintal. É um velho com cara de guarda-livros que, sem pedir licença, invade o universo infantil de uma pelada e vai expulsando todo mundo. Num instante, o campo está vazio, o mundo está vazio. Não deu tempo nem de desfazer as traves feitas de camisas.

O espantalho-gente pega a bola, viva, ainda, tira do bolso um canivete e dá-lhe a primeira espetada. No segundo golpe, a bola começa a sangrar.

Em cada gomo o coração de uma criança.


Do livro "
Os melhores da crônica brasileira", José Olympio Editora - Rio de Janeiro, 1977, pág. 29, extraímos o texto acima.
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Juízo de Fato e Juízo de Valor

Juízo de fato e de valor
Se dissermos: “Está chovendo”, estaremos enunciando um acontecimento constatado por nós e o juízo proferido é um juízo de fato. Se, porém, falarmos: “A chuva é boa para as plantas” ou “A chuva é bela”, estaremos interpretando e avaliando o acontecimento. Nesse caso, proferimos um juízo de valor.
Juízos de fato são aqueles que dizem o que as coisas são, como são e por que são. Em nossa vida cotidiana, mas também na metafísica e nas ciências, os juízos de fato estão presentes. Diferentemente deles, os juízos de valor - avaliações sobre coisas, pessoas e situações - são proferidos na moral, nas artes, na política, na religião.
Juízos de valor avaliam coisas, pessoas, ações, experiências, acontecimentos, sentimentos, estados de espírito, intenções e decisões como bons ou maus, desejáveis ou indesejáveis.
Os juízos éticos de valor são também normativos, isto é, enunciam normas que determinam o dever ser de nossos sentimentos, nossos atos, nossos comportamentos. São juízos que denunciam obrigações e avaliam intenções e ações segundo o critério do correto e do incorreto.
Os juízos éticos de valor nos dizem o que são o bem, o mal, a felicidade. Os juízos éticos normativos nos dizem que sentimentos, intenções, atos e comportamentos devemos ter ou fazer para alcançarmos o bem e a felicidade.
Enunciam também que atos, sentimentos, intenções e comportamentos são condenáveis ou incorretos do ponto de vista moral.
Como se pode observar, senso moral e consciência moral são inseparáveis da vida cultural, uma vez que esta define para seus membros os valores positivos e negativos que devem respeitar ou detestar.
Qual a origem da diferença entre os dois tipos de juízos? A diferença entre a Natureza e a Cultur a. A primeira, como vimos, é constituída por estruturas e processos necessários, que existem em si e por si mesmos, independentemente de nós: a chuva é um fenômeno meteorológico cujas causas e cujo efeitos necessários podemos constatar e explicar. Por sua vez, a Cultura nasce da maneira como os seres humanos interpretam a si mesmos e suas relações com a Natureza, acrescentando-lhe sentidos novos, intervindo nela, alterando-a através do trabalho e da técnica, dando-lhe valores.
Dizer que a chuva é boa para as plantas pressupõe a relação cultural dos humanos com a Natureza, através da agricultura. Considerar a chuva bela pressupõe uma relação valorativa dos humanos com a Natureza, percebido como objeto de contemplação.
Freqüentemente, não notamos a origem cultural dos valores éticos, do senso moral e da consciência moral, porque somos educados (cultivados) para eles e neles, como se fossem naturais ou fáticos, existentes em si e por si mesmos. Para garantir a manutenção dos padrões morais através do tempo e sua continuidade de geração a geração, as sociedades tendem a naturalizá-los. A naturalização da existência moral esconde, portanto, o mais importante da ética: o fato de ela ser criação histórico-cultural.

Questões:

O que é juízo de fato?
O que é juízo de valor?
Qual a diferença entre os juízos?
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segunda-feira, 16 de maio de 2011

Definição de estética

Estética
substantivo feminino 1Rubrica: filosofia.parte da filosofia voltada para a reflexão a respeito da beleza sensível e do fenômeno artístico
1.1
Rubrica: filosofia.segundo o criador do termo, o filósofo alemão Alexander Baumgarten (1714-1762), ciência das faculdades sensitivas humanas, investigadas em sua função cognitiva particular, cuja perfeição consiste na captação da beleza e das formas artísticas
1.2
Rubrica: filosofia.no kantismo, estudo dos juízos por meio dos quais os seres humanos afirmam que determinado objeto artístico ou natural desperta universalmente um sentimento de beleza ou sublimidade
1.3
Rubrica: filosofia.no hegelianismo, estudo da beleza artística, que apresenta em imagens sensoriais, ou representações sensíveis, a verdade do espírito, do princípio divino, ou da idéia
2 harmonia das formas e/ou das cores; beleza
Ex.: a e. de uma escultura de Giacometti3Ex.: clínica de e.4Uso: informal.aparência física; plásticaEx.: dispensa muitos cuidados à sua e. ramo ou atividade profissional que tem por fim corrigir problemas cutâneos, capilares etc., assim como conservar ou dar mais viço à beleza física de uma pessoa, por meio de tratamentos especiais (p.ex., limpeza de pele, emagrecimento etc.)

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"Todos os homens são Filósofos"

Todos os homens são filósofos
Para o filósofo italiano Antonio Gramsci (1891-1937) é necessário destruir o preconceito, muito comum, de que a filosofia é algo muito difícil, que a filosofia é uma atividade intelectual própria de uma determinada classe de cientistas especializados ou de estudiosos profissionais e completamente sistemáticos. É preciso, portanto, demonstrar inicialmente que todos os homens são 'filósofos', mostrando e definindo os limites e as características desta 'filosofia espontânea', que é inerente às pessoas em geral, ou seja, a 'todo o mundo', isto quer dizer, que a filosofia está contida: 1) na própria linguagem humana, que é um conjunto de noções e de conceitos determinados e não, apenas, de palavras gramaticalmente vazias de conteúdo; 2) no senso comum e no bom senso; 3) na religião popular e, consequentemente, em todo o sistema de crenças, superstições, opiniões, modos de ver e de agir que se manifestam naquilo que geralmente nós chamamos e conhecemos por 'folclore'.
Após demonstrar que todos são filósofos, ainda que a seu modo, inconscientemente – já que, até mesmo na mais simples manifestação de uma atividade intelectual qualquer, na 'linguagem', está presente no homem uma determinada concepção do mundo, uma maneira de conceber o 'cosmos', o que desde os gregos é tarefa do filósofo. Daí Gramsci passa a um segundo momento, ao momento da crítica e da consciência, ou seja, ao seguinte problema: é preferível 'pensar' sem ter consciência crítica disto ou daquilo, de uma maneira desagregada e ocasional, isto é, 'participar' de uma concepção do mundo 'imposta' mecanicamente pelo ambiente exterior, ou seja, por um dos muitos grupos sociais nos quais todos estão automaticamente envolvidos desde sua entrada no mundo consciente (e que pode ser a própria aldeia ou a província, pode se originar na paróquia e na 'atividade intelectual' do vigário ou do velho patriarca, cuja 'sabedoria' dita leis, na mulher que herdou a sabedoria das bruxas ou no pequeno intelectual avinagrado pela própria estupidez e pela impotência para a ação), ou é preferível elaborar a própria concepção do mundo de uma maneira consciente e crítica e, portanto, em ligação com este trabalho do próprio cérebro, escolher a própria esfera de atividade, participar ativamente na produção da história do mundo, ser o guia de si mesmo e não mais aceitar do exterior, passiva e servilmente, a marca da própria personalidade?
Pela própria concepção do mundo, pertencemos sempre a um determinado grupo, precisamente o de todos os elementos sociais que compartilham o mesmo modo de pensar e de agir que nós. Somos conformistas de algum conformismo, somos sempre homens-massa ou homens-coletivos. O problema é o seguinte: qual é o tipo histórico de conformismo, de homem-massa do qual fazemos parte? Quando a concepção do mundo não é crítica e coerente, mas ocasional e desagregada, pertencemos simultaneamente a uma multiplicidade de homens-massa, nossa própria personalidade é compósita, de uma maneira bizarra: nela se encontram elementos dos homens das cavernas e princípios da ciência mais moderna e progressista, preconceitos de todas as fases históricas passadas estreitamente localistas e intuições de uma futura filosofia que será própria do gênero humano mundialmente unificado. Criticar a própria concepção do mundo, portanto, significa torná-la unitária e coerente e elevá-la até o ponto atingido pelo pensamento mundial mais evoluído. Significa também, portanto, criticar toda a filosofia até hoje existente, na medida em que ela deixou estratificações consolidadas na filosofia popular. O início da elaboração crítica é a consciência daquilo que é realmente, isto é, um 'conhece-te a ti mesmo' (como disse Sócrates) como produto do processo histórico até hoje desenvolvido, que deixou em você uma infinidade de traços acolhidos sem análise crítica.
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sábado, 19 de março de 2011

Resumo da Carta sobre a Felicidade por Carol S. Nemer

Carta sobre a Felicidade
Não há idade para dedicar-se à filosofia, porque nos mais variados momentos esta será útil te fazendo viver o que está por vir ou aquilo que já passou.
Pense sobre a divindade e atribua a ela o que for capaz de conservar a felicidade e sua imortalidade. A consciência de que um dia a morte chegará faz com que o aproveitamento da vida seja melhor e, portanto não há o desejo de se conseguir a imortalidade.
A morte não deve ser temida, nem desdenhada, só deve ser aguardada e aceita em sua hora de agir, pois esse sentimento não deve nos deixar preocupados, nem aflitos. 
A decisão de viver é direito de cada um, porém o futuro não é e nem deve ser controlado pelas pessoas. Se há o desejo de viver, a vida deve ser desfrutada como foi destinado a você, sem desejos frívolos, desnecessários, porque os desejos úteis fazem partem, naturalmente, de seu dia a dia.
A vida deve ser vivida prazerosamente, pois a ausência deste sentimento vem à insatisfação e junto a ela sofrimento, tirando o bem estar da alma e do corpo.
É por isso que a base da vida é o prazer, do início ao fim. Porém, muitas vezes alguns prazeres são evitados ao reconhecermos que o mesmo trará desagrado, pois nem todo prazer é um bem e nem toda dor é um mal.
Podemos nos habituar a viver uma vida sem luxo ou pequenos prazeres, como iguarias requintadas e ainda sermos felizes. Viver apenas respeitando a vida como deve ser não ajuda só a saúde, mas prepara o ser humano para enfrentar sem medo as adversidades da vida.
A sorte, porém, não é uma divindade, mas pode proporcionar o início de coisas boas e ruins. Mas é preferível ser sábio, sem crer na sorte, e desafortunado, a ser tolo, crer na sorte, a afortunado.
O homem feliz é o que se encontra no mundo dos mortais sem ambicionar outros bem, mortais ou imortais.
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terça-feira, 15 de março de 2011

Vídeos Aristóteles

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segunda-feira, 14 de março de 2011

Ensaio acerca do entendimento de John Locke.

Ensaio acerca do entendimento. Livro II, cap. I. John Locke. Tradução Anoar Aiex.
1. Ideia é o objeto do pensamento. Todo homem tem consciência de que pensa, e que quando está pensando sua mente se ocupa de ideias. Por conseguinte, e indubitável que as mentes humanas tem varias ideias, expressas, entre outros, pelos termos brancura, dureza, doçura, pensamento, movimento, homem, elefante, exército, embriaguez. Disso decorre a primeira questão a ser investigada: como elas sao apreendidas? 
Consiste numa doutrina aceita que o ser primordial dos homens tern ideias inatas e caracteres originais estampados em sua mente. Já examinei, em linhas gerais, essa opinião, e suponho que o que foi dito no livro anterior será facilmente admitido quando tiver mostrado como o entendimento obtém todas as suas ideias" e por quais meios e graus elas podem penetrar na mente; com este fim solicitarei a cada urn recorrer a sua própria observação e experiência. 
 2. Todas as ideias dereivam da sensação e reflexão. Suponhamos, pois, que a mente é, como dissemos, um papel em branco, desprovida de todos os caracteres, sem nenhuma ideia; como ela será suprida? De onde lhe provem este vasto estoque, que a ativa e ilimitada fantasia do homem pintou nela com uma variedade quase infinita? De onde apreende todos os materiais da razão e do conhecimento? A isso respondo, numa palavra: da experiência. Todo o nosso conhecimento está nela fundado, e dela deriva fundamentalmente o próprio conhecimento. Empregada tanto nos objetos sensíveis externos como nas operações internas de nossas mentes, que são por nos mesmas percebidas e refletidas, nossa observação supre nossos entendimentos com todos os materiais do pensamento. Dessas duas fontes de conhecimento jorram todas as nossas ideias, ou as que possivelmente teremos. 
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quarta-feira, 2 de março de 2011

Aristóteles e a sistematização do conhecimento

Aristóteles e a sistematização do conhecimento 
Aristóteles apresenta, nesse período, uma verdadeira enciclopédia de todo o saber que foi produzido e acumulado pelos gregos em todos os ramos do pensamento e da prática considerando essa totalidade de saberes como sendo a Filosofia. Esta, portanto, não é um saber específico sobre algum assunto, mas uma forma de conhecer todas as coisas, possuindo procedimentos diferentes para cada campo de coisas que conhece.
Além de a Filosofia ser o conhecimento da totalidade dos conhecimentos e práticas humanas, ela também estabelece uma diferença entre esses conhecimentos, distribuindo-os numa escala que vai dos mais simples e inferiores aos mais complexos e superiores. Essa classificação e distribuição dos conhecimentos fixou, para o pensamento ocidental, os campos de investigação da Filosofia como totalidade do saber humano.
Cada saber, no campo que lhe é próprio, possui seu objeto específico, procedimentos específicos para sua aquisição e exposição, formas próprias de demonstração e prova. Cada campo do conhecimento é uma ciência (ciência, em grego, é episteme). Aristóteles afirma que, antes de um conhecimento constituir seu objeto e seu campo próprios, seus procedimentos próprios de aquisição e exposição, de demonstração e de prova, deve, primeiro, conhecer as leis gerais que governam o pensamento, independentemente do conteúdo que possa vir a ter. O estudo das formas gerais do pensamento, sem preocupação com seu conteúdo, chama-se lógica, e Aristóteles foi o criador da lógica como instrumento do conhecimento em qualquer campo do saber.
A lógica não é uma ciência, mas o instrumento para a ciência e, por isso, na classificação das ciências feita por Aristóteles, a lógica não aparece, embora ela seja indispensável para a Filosofia e, mais tarde, tenha se tornado um dos ramos específicos dela.

Os campos do conhecimento filosófico
Vejamos, pois, a classificação aristotélica:
Ciências produtivas: ciências que estudam as práticas produtivas ou as técnicas, isto é, as ações humanas cuja finalidade está para além da própria ação, pois a finalidade é a produção de um objeto, de uma obra. São elas: arquitetura (cujo fim é a edificação de alguma coisa), economia (cujo fim é a produção agrícola, o artesanato e o comércio, isto é, produtos para a sobrevivência e para o acúmulo de riquezas), medicina (cujo fim é produzir a saúde ou a cura), pintura, escultura, poesia, teatro, oratória, arte da guerra, da caça, da navegação, etc. Em suma, todas as atividades humanas técnicas e artísticas que resultam num produto ou numa obra.
Ciências práticas: ciências que estudam as práticas humanas enquanto ações que têm nelas mesmas seu próprio fim, isto é, a finalidade da ação se realiza nela mesma, é o próprio ato realizado. São elas: ética, em que a ação é realizada pela vontade guiada pela razão para alcançar o bem do indivíduo, sendo este bem as virtudes morais (coragem, generosidade, fidelidade, lealdade, clemência, prudência, amizade, justiça, modéstia, honradez, temperança, etc.); e política, em que a ação é realizada pela vontade guiada pela razão para ter como fim o bem da comunidade ou o bem comum.
Para Aristóteles, como para todo grego da época clássica, a política é superior à ética, pois a verdadeira liberdade, sem a qual não pode haver vida virtuosa, só é conseguida na polis. Por isso, a finalidade da política é a vida justa, a vida boa e bela, a vida livre.
Ciências teoréticas, contemplativas ou teóricas: são aquelas que estudam coisas que existem independentemente dos homens e de suas ações e que, não tendo sido feitas pelos homens, só podem ser contempladas por eles. Theoria, em grego, significa contemplação da verdade. O que são as coisas que existem por si mesmas e em si mesmas, independentes de nossa ação fabricadora (técnica) e de nossa ação moral e política? São as coisas da Natureza e as coisas divinas.
Aristóteles, aqui, classifica também por graus de superioridade as ciências teóricas, indo da mais inferior à superior:
1. ciência das coisas naturais submetidas à mudança ou ao devir: física, biologia, meteorologia, psicologia (pois a alma, que em grego se diz psychê, é um ser natural, existindo de formas variadas em todos os seres vivos, plantas, animais e homens);
2. ciência das coisas naturais que não estão submetidas à mudança ou ao devir: as matemáticas e a astronomia (os gregos julgavam que os astros eram eternos e imutáveis);
3. ciência da realidade pura, que não é nem natural mutável, nem natural imutável, nem resultado da ação humana, nem resultado da fabricação humana. Trata-se daquilo que deve haver em toda e qualquer realidade, seja ela natural, matemática, ética, política ou técnica, para ser realidade. É o que Aristóteles chama de ser ou substância de tudo o que existe. A ciência teórica que estuda o puro ser chama-se metafísica;
4. ciência teórica das coisas divinas que são a causa e a finalidade de tudo o que existe na Natureza e no homem. Vimos que as coisas divinas são chamadas de theion e, por isso, esta última ciência chama-se teologia.
A Filosofia, para Aristóteles, encontra seu ponto mais alto na metafísica e na teologia, de onde derivam todos os outros conhecimentos.
A partir da classificação aristotélica, definiu-se, no correr dos séculos, o grande campo da investigação filosófica, campo que só seria desfeito no século XIX da nossa era, quando as ciências particulares se foram separando do tronco geral da Filosofia. Assim, podemos dizer que os campos da investigação filosófica são três:
1. O do conhecimento da realidade última de todos os seres, ou da essência de toda a realidade. Como, em grego, ser se diz on e os seres se diz ta onta, este campo é chamado de ontologia (que, na linguagem de Aristóteles, se formava com a metafísica e a teologia).
2. O do conhecimento das ações humanas ou dos valores e das finalidades da ação humana: das ações que têm em si mesmas sua finalidade, a ética e a política, ou a vida moral (valores morais) e a vida política (valores políticos); e das ações que têm sua finalidade num produto ou numa obra: as técnicas e as artes e seus valores (utilidade, beleza, etc.).
3. O do conhecimento da capacidade humana de conhecer, isto é, o conhecimento do próprio pensamento em exercício. Aqui, distinguem-se: a lógica, que oferece as leis gerais do pensamento; a teoria do conhecimento, que oferece os procedimentos pelos quais conhecemos; as ciências propriamente ditas e o conhecimento do conhecimento científico, isto é, a epistemologia.
Ser ou realidade, prática ou ação segundo valores, conhecimento do pensamento em suas leis gerais e em suas leis específicas em cada ciência: eis os campos da atividade ou investigação filosófica.
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segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O que é crítica de cinema

5/07/2010 - 08h00 Folha de SP
André Setaro fala sobre a crítica de cinema
EUCLIDES SANTOS MENDES
DE SÃO PAULO
Três perguntas para o crítico e professor de comunicação na Universidade Federal da Bahia André Setaro -que tem textos reunidos na trilogia "Escritos Sobre Cinema" (Edufba/Azougue, org. Carlos Ribeiro, 656 págs., R$ 65).
O que é a crítica de cinema?
A rigor, a função da crítica de cinema é ajudar o espectador a percorrer o itinerário do filme com um mínimo de conhecimento da sua linguagem, de modo a permitir que se reconheça, durante o trajeto, aquilo que é importante e o que não é. Uma função, portanto, que, mesmo antes de se reportar à apreciação estética da obra considerada no seu conjunto, incide sobre a sua sucessiva "racionalização", quer dizer, a tradução em termos lógico-discursivos do sentido poético que ela exprime através dos procedimentos de significação que lhe são próprios. É necessário que o aspirante a crítico construa primeiro um repertório para depois se aventurar na análise fílmica. A crítica é a arte da paciência.
O cinema é uma arte em crise?
A linguagem cinematográfica, a partir de David Wark Griffith -diretor de "O Nascimento de uma Nação" (1915), filme que instaurou a montagem narrativa com eficiência dramática-, foi sendo elaborada e enriquecida durante seis décadas do século passado. Os realizadores inventores de fórmulas, que contribuíram na evolução da linguagem (Orson Welles, Hitchcock, Godard, tantos!), se esgotaram em meados da década de 1960, quando houve uma espécie de exaustão e a invenção foi substituída por estilos pessoais. O cinema é uma arte em crise porque todos os bons filmes já foram feitos, como gostava de dizer o cineasta americano Peter Bogdanovich.
Como caracterizaria o cinema brasileiro contemporâneo?
Ao depender da captação de recursos, perdeu muito a sua independência criativa. Se houve evolução na técnica (a qualidade pode ser comparada a dos filmes estrangeiros), não se percebe, atualmente, a emergência estética. O chamado cinema de invenção (Ozualdo Candeias, Mojica, Sganzerla...) não tem mais espaço no panorama atual. A produção mais independente se encontra concentrada nos filmes feitos em digital por uma nova geração (como os apresentados na Mostra Aurora de Tiradentes neste ano).
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domingo, 20 de fevereiro de 2011

Resumo do pensamento de Augusto Comte



Auguste Comte
e o positivismo sociológico 
Animado desde a juventude com propósitos de “regeneração universal", sucessivamente pai oficial da sociologia, Auguste Comte (1798-1857) é o autor do Curso de filosofia positiva (1830-1842, em seis volumes). E é aqui que ele formula sua famosa lei dos três estágios, segundo a qual a humanidade, assim como a psique dos indivíduos particulares, passa por três estágios:
  1. estágio teológico;
  2. estágio metafísico;
  3. estágio positivo.
No estágio teológico os fenómenos são interpretados como “produtos da ação direta e contínua de agentes sobrenaturais, mais ou menos numerosos"; no estágio metafísico são explicados com referência a essências, ideias, forças abstratas como a "simpatia", a “alma vegetativa" etc.; no estágio positivo o homem procura descobrir, "com o uso bem combinado do raciocínio e da observação", as leis efetivas “de sucessão e de semelhança" que presidem ao acontecimento dos fenômenos.
O objetivo da ciência - escreve Comte - é a pesquisa das leis, e isso por causa do fato de que “apenas o conhecimento das leis dos fenômenos [ ... ] pode evidentemente levar-nos na vida ativa a modificá-los para nossa vantagem". Ciência, de onde previsão; previsão, de onde acão. Na esteira de Bacon e de Descartes, Comte afirma que será a ciência que fornecera ao homem o domínio sobre a natureza. Por conseguinte, é indispensável conhecer sociedades. Eis, então, que Comte propõe a ciência da sociedade, a sociologia, como física social, que tem como tarefa a descoberta das leis que guiam os fenômenos sociais, assim como a física estabelece as leis dos fenômenos físicos; e faz isso por meio de observações e comparações. A física social ou sociologia divide-se em estática social e dinâmica social.
 A estática social estuda as condições comuns que permitem a existência das diversas sociedades no tempo: a sociabilidade fundamental do homem, a família, a divisão do trabalho e a cooperação nos esforços etc. A lei fundamental da estática social e a da ligação entre os diversos aspectos da vida social (político, econômico, cultural etc.). A dinâmica social compreende o estudo das leis de desenvolvimento da sociedade. A lei fundamental da dinâmica social e dos três estágios. E eis um exemplo de aplicação desta lei: o feudalismo  estágio teológico; a revolução (que começa com a reforma protestante e termina com a revolução francesa) e estágio metafísico; a sociedade industrial e estágio positivo.
 Entre as ciências, a sociologia é a mais complexa, uma vez que - na hierarquia estabelecida por Comte e que quer ser uma ordem lógica, histórica e pedagógica - pressupõe a biologia, a qual pressupõe a química, que, por sua vez, pressupõe a física. Nesta perspectiva, a filosofia deve "determinar exatamente o espírito de cada ciência, descobrir suas relações, reassumir, se possível, todos os seus princípios próprios em número mínimo de princípios comuns, conforme o método positivo".
 A regeneração da sociedade - que, sobre a base do conhecimento das leis sociais, Comte propõe no Sistema de política positiva (1851-1854) - assume as formas de uma religião, onde a Deus se substitui a humanidade, ao amor de Deus o da humanidade. Humanidade que é conjunto de todos os homens vivos, dos mortos e dos que devem ainda nascer. Os indivíduos se regeneram, dentro da humanidade, como as células de um organismo. Os indivíduos são o produto da humanidade: esta deve ser venerada como outrora o eram os deuses pagãos. E, fascinado pelo universalismo do catolicismo, Comte propõe sua religião da humanidade como copia da ordem da Igreja católica: com dogmas (filosofia positiva, leis científicas), batismo secular, crisma secular etc.; com templos leigos (institutos científicos) e um papa positivo que vigiará o desenvolvimento da industria e a utilização prática das descobertas. Haverá nomes novos para os meses e para os dias. A mulher é considerada o anjo da guarda positivo.
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A sociologia como física social (Comte)


A sociologia como física social

Para passar de uma sociedade em crise para a "ordem social" , há necessidade de saber. O conhecimento é feito de leis provadas com base nos fatos. Desse modo, e preciso encontrar as leis da sociedade se quisermos resolver suas crises e prever o desenvolvimento futuro da convivência social.
Portanto, para a sociologia, através do raciocino e da observação, é possível estabelecer as leis dos fenômenos sociais, como a física pode estabelecer as leis que guiam os fenômenos físicos.
Comte divide a sociologia, ou física social, em:
  1. estática social;
  2. dinâmica social.
     a) A estática social estuda as condições de existência comuns a todas as sociedade em todos os tempos. Tais condições são a sociabilidade fundamental do homem, o núcleo familiar e a divisão do trabalho, que se concilia com "a cooperação dos esforços". A lei fundamental da estática social e a conexão entre os diversos aspectos da vida social, de modo que, por exemplo, uma constituição política não e independente de fatores como o econômico e o cultural.
    b) Por seu turno, a dinâmica social consiste no estudo das leis de desenvolvi­ mento da sociedade. Sua lei fundamental e a dos três estágios. Também o progresso social segue essa lei. Ao estágio teológico corresponde a supremacia do poder militar (e o caso do feudalismo); ao estagio metafísico, corresponde a revolução (que começa com a Reforma protestante e termina com a Revolução Francesa); ao estagio positivo, corresponde a sociedade industrial.
    Mas através de que caminhos podemos conhecer as leis da sociedade? Na opinião de Comte, os caminhos para alcançar conhecimento sociológico são a observação, o experimento e o método comparativo.
    A observação dos fatos sociais e observação direta e enquadrada na teoria, isto e, na teoria dos três estágios. Em sociologia o experimento não e tão simples como em física ou em química, que o se pode mudar as sociedades a vontade; entretanto, da mesma forma que em biologia, também na sociologia os casos patológicos, alterando
    o nexo normal dos acontecimentos, substituem de certo modo o experimento. O método comparativo estuda as analogias e a diferenças entre as diversas sociedades, no seus respectivos estágios de desenvolvimento. E, diz Comte, e o método histórico que constitui "a única base fundamental sobre a qual pode real mente se basear o sistema da lógica política".
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